Cadu e a bicicleta


Hoje vamos falar da rotina de Cadu, 22 anos, nasceu e vive no Capão Redondo, periferia de São Paulo, vítima de uma bala perdida quando bebê. Ele trabalha em uma rede de fast-food de dia e a noite entrega comida de bicicleta.

Pedir comida é um hábito dos paulistanos, e com a pandemia isso se intensificou, juntamente com os aplicativos que facilitam muito a vida de quem pede, mas não a dos entregadores, com a crescente onda de desemprego muita gente tem buscado as entregas como forma de sobreviver, aumentando a concorrência e diminuindo os ganhos dos entregadores, mas aumentando do aplicativo, obviamente.

Cadu trabalha todos os dias da semana, em média mais de 10 horas por dia, entre a lanchonete e as entregas de bicicleta, quando não está trabalhando está na igreja ou jogando Free- Fire.

Para fazer as entregas, Cadu sai de seu bairro na periferia e pedala até os bairros nobres de São Paulo. Muitos entregadores fazem grandes deslocamentos de bicicleta para fazer as entregas, há casos de entregadores que preferem dormir na rua para poder ter mais tempo hábil de trabalho no dia seguinte devido a distância entre a periferia e os bolsões com maior quantidade de pedidos.

Carlos Eduardo, o Cadu, quando tinha 1 ano e 7 meses foi vítima de uma bala perdida enquanto brincava com outras crianças na frente de sua casa. Na rua, são várias casas de alvenaria coladas uma na outra, formando um dos muitos becos e vielas que costuram em zigue-zague, favela adentro, o Morro do Piolho, no Capão Redondo. A mãe de Cadu conta que o tiro foi um dos 70 que "fizeram de peneira" o corpo de um homem ligado ao tráfico, que estava sentado conversando ao lado das crianças quando foi emboscado e executado.

O projétil atingiu o bebê Cadu logo abaixo do olho esquerdo, estacionando atrás do globo ocular. Na correria causada pelo tiroteio, inicialmente a mãe e a avó acharam que ele só havia caído e cortado o rosto. Mas a quantidade de sangue fez com que elas corressem com ele para o Hospital do Campo Limpo, a 4 km dali. Depois de algumas horas de espera, o médico trouxe a notícia: o bebê tinha uma bala alojada na cabeça.

Cadu não morreu. A mãe conta que os médicos avaliaram que era alto demais o risco de uma cirurgia de remoção. Assim, o menino passou a infância retornando ano a ano para consultas no Hospital das Clínicas de São Paulo. Em determinado momento chegaram a cogitar aposentá-lo por invalidez, mas, no fim das contas, foi constatado que o projétil atrás do olho não havia deixado qualquer sequela significativa.


Cadu de fato não é um inválido, e ser aposentado precocemente não é algo que alguém almeje, porém é interessante pensar que uma criança é baleada em uma das regiões mais violentas da cidade de São Paulo, e portanto uma das regiões com menor atenção do poder público, e não possui qualquer indenização ou qualquer direito, ele hoje trabalha em dois empregos, não é citada na reportagem que usamos de fonte, mas aparentemente Cadu não teve direito a uma faculdade pois todo seu tempo está colocado na sobrevivência.

No seu emprego fixo que possui a 6 anos ele recebe R$850, trabalhando 5 dias por semana, 6 horas diárias, boa parte do dinheiro era para pagar o aluguel e o que sobrava pagava as contas, e por isso ele começou a fazer entregas, dica dada por um amigo. 

Na bicicleta ele está 4 dias por semana, recebendo algo em torno de R$ 800, que ele está juntando para poder comprar uma moto, um transporte desejado por muitos jovens da periferia, e também um meio de receber mais dos aplicativos.

Assim como Cadu, existem muitos outros trabalhadores em cima de bicicletas e motos pelo Brasil, se expondo ao risco do trânsito, e da necessidade de pressa e velocidade já que é preciso fazer a maior quantidade de entregas possível, o que acaba obrigando os entregadores a fazerem manobras arriscadas, irem além dos limites de velocidade, infringir leis de trânsito e outros pormenores, para se manter, manter a família.

Os aplicativos não tratam e não enxergam os entregadores como funcionários, então nos acidentes que são comuns, caso a moto tenha seu funcionamento comprometido, impedindo o trabalho, o entregador não tem qualquer ajuda ou algum tipo de seguro para auxíliá-lo nesse período sem trabalho, e o mesmo ocorre caso ele se machuque, o que é ainda mais grave, já que dependendo da gravidade o trabalhador precisa de assistência.

Há casos de falecimento do motociclista, onde a empresa do aplicativo vai até o local, apenas para pegar a maquininha, há casos que a moto quebra, o pedido não pode ser feito, e o aplicativo encerra a participação do entregador, ou seja, ele não pode mais fazer entregas pelo aplicativo, o que na prática é tornar inviável sua sobrevivência, já que há um monopólio neste mercado.

Este é um exercício de redação baseado em algumas fontes e na minha experiência em São Paulo como morador da periferia, frequentador do centro, e usuário de aplicativos, agradeço quem tenha lido até aqui, e espero que além de auxiliar o meu aprendizado, você tenha se aproximado um pouco mais da realidade do mundo das entregas, e se tratando de precarização, do seu mundo. Até breve!

Fontes:

Unisinos
O Mirante Joinville
BBC
Globo
Reclame Aqui

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